Se até eu escrevo, quem és tu para não acreditar.
Isso é, também, orgulho.
Vivida nunca tivera grande habilidade para distinguir a
fantasia do autêntico e palpável. Dos livros que lera, à revelia de seu pai, haviam-se-lhe
intersectado as ideias com suas próprias vivências. Seu pai lhe dizia que a
literatura era para os loucos e que gerava padecimentos múltiplos. Com o
repetir do costume, se instalou a doença moderna e contagiosa, o Síndrome
Utópico. Doença dos leitores, sonhadores e alguns políticos, permanecia, no
entanto, rara. Processo moroso foi o do diagnóstico. Seu pai, Facilitado, desconfiado
da instalação do agente infecioso em sua primogénita, correu à procura de
especialista. Embora pouco estudada, diziam as mulheres de idade que era mal
de peito profundo, tendo Facilitado, por essa razão, catado cura nos médicos do
coração. Nem esses, nem os restantes, nem até as benzeduras da Tia Ascensão-Céu
Virgem, a livraram do infortúnio. Com sentença vitalícia para padecimento de
Síndrome Utópico andou, desde então, vivendo Vivida. O que Facilitado desconhecia era
que esta, secretamente, preservava um lerdo orgulho por carregar esta doença na
profundura de entre os seios.
Até aqui a história de Vivida pode parecer-vos trivial. O
que desconhecem, caros leitores, é que este Síndrome Utópico carrega consigo
mais peso do que pode, primeiramente, sugerir.
Papoila
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