Caríssim@s,
Apesar de nos mantermos em silêncio durante tanto tempo, a nossa história convosco continua muito presente. Tenho comentado com a Papoila que deveríamos voltar a escrever-vos, contar-vos das novidades, porque imagino que seja importante para algumas pessoas, assim como foi para nós a certa altura. Recebemos um comentário recentemente que confirmou que este blog continua presente na memória de algumas pessoas e que é relevante. Temos tantas boas memórias de tudo o que o blog nos trouxe que se torna imprescindível dar-vos notícias.
Já somos as duas especialistas! Eu terminei no ano passado e a Papoila este ano. Isto dá-nos mais alguma autonomia e liberdade e permite-nos pensar noutros projetos. Estamos muito satisfeitas por termos terminado esta fase de formação (e com muito bom aproveitamento, tenho de confessar) e entusiasmadas em encontrar novos desafios profissionais.
Eu pessoalmente ando mais envolvida em temáticas LGBT, tentando colmatar algumas lacunas que havia em termos da presença da minha especialidade em certas áreas de intervenção, mas não estou restrita a esses temas. Há tanto para fazer que não consigo, nem devo, restringir a minha abordagem. Gosto muito do que faço, sinto que sou reconhecida, mas ainda tenho tanto para aprender e fazer.
A Papoila também é uma apaixonada pela sua especialidade. Eu fico tão orgulhosa quando a vejo a cuidar da minha família, quando a minha avó adoece e lá vai ela auscultar e prescrever o tratamento. É tão atenciosa e dedicada, preocupa-se efetivamente com os doentes e isso nota-se e é valorizado por quem a rodeia, seja doentes seja colegas.
A Papoila, no final de 2017, fez um estágio de um mês nos Açores. Creio que foi um dos meses mais felizes da vida dela, a ir de bicicleta para o trabalho, a tirar fotografias incríveis, a visitar sítios lindíssimos e a trabalhar num sítio tão especial. Ela certamente teria muito mais para dizer sobre esta experiência, talvez um dia a convença a vir cá deixar umas palavras.
A nossa família continua unida, apoiante e próxima. A minha mãe continua muito ativa na AMPLOS e já levou a mãe da Papoila a alguns encontros. Já não fazemos ideia quem da família alargada não saberá ainda da nossa relação, de tão banal que se tornou. Não somos diferentes, não nos sentimos diferentes e raramente nos lembramos da vergonha e medo que sentíamos no início.
É curioso também como sinto isto no grupo de amigos. Todos os nossos amigos heterossexuais a casar e a ter filhos e a perguntar-nos quando é a nossa vez. Não há diferença na pergunta, seja dirigida a nós ou a outro casal amigo qualquer. Talvez umas perguntas adicionais (quem engravida?), mas sempre com um sorriso e entusiasmo. É provavelmente por isso que a necessidade de escrever neste blog diminui. Porque nos sentimos plenamente integradas, aceites, compreendidas, que conseguimos esquecer-nos que nem sempre foi assim. E se sentirmos alguma discriminação, temos tantas vozes que nos ajudam.
E quando casamos e temos filhos? Decidimos tentar no ano passado, quando eu terminei o internato. Já tínhamos decidido que seria a Papoila a engravidar (estava desejosa de ter essa experiência) e fizemos três inseminações artificiais, mas infelizmente não funcionaram. Foram momentos muito ansiogénicos e difíceis, não dá para "engravidar quando não se está à espera", não dá para tirar a ansiedade, a expectativa, a contagem dos dias e das horas, das injeções e dos milimetros dos folículos... Decidimos interromper, focar-nos no final do internato da Papoila e, agora que já terminou, vamos ver se recuperamos algum orçamento para tentarmos novamente. Desta vez, provavelmente, por fertilização in vitro, aumenta muito a possibilidade de gravidez. O projeto da maternidade é muito importante para nós, esperamos que o possamos concretizar em breve.
Até lá, continuamos a disfrutar da companhia da Leslie, que está cada vez mais fofa. Já com seis anos, tem apurado a doçura do olhar para nos pedir festas ou comida, sabe bem como seduzir-nos. Estamos neste momento de férias e ela está cá connosco, a passear nas rochas e na praia connosco, muito alegre.
Mudámo-nos para a margem sul quando o valor das rendas subiu. A Leslie agora tem uma casa com grandes varandas e janelas para ver a rua. Estamos bem, perto de Lisboa e das nossas pessoas na mesma, apesar de ainda algo isoladas, devido ao período de estudo intensivo recente. Mas vem aí o Verão e certamente a casa irá animar e receber muita gente amiga.
Caríssim@s, por agora é tudo. Estamos por cá, continuamos juntas (quase 12 anos!) e a história continua a fazer-se. Vocês fazem parte dela.
Orquídea