Devo dizer-te que esperava que fosses mais alta e que, no primeiro relance, fiquei surpresa: afinal eras pequenina. Que raio. Eu, que te tinha previsto bem maior - de uma altura consensual com o talento da tua escrita. Admito que ia preparada para me pôr em bicos de pés, tal bailarina desajeitada. Afinal o teu sorriso estava mais acessível aos meus olhos. Soube melhor assim, até.
Disse-lhe, quando chegámos a casa, que tinha sentido vontade de te abraçar. Ambas sabemos o quão raro isso vai sendo em mim, cada vez mais criteriosa em relação aqueles com quem decido partilhar mais que um abraço político. Apeteceu-me abraçar-te com força, porra. Que sensação estranha, que nem te conheço as mãos já quero saber a que sabe o resto.
Não sei se eram as tuas feições, que teimavam em procurar parecenças com o meu reportório de contactos próximos. Ou que um dia o foram. Ou talvez fosse o sotaque que, honestamente, fui incapaz de inserir num grupo vulgar - não me soava a algarvio, que queres? Talvez seja resultado de uma miscelânea de francês, lisboeta e algarvio… que torna tudo mais difícil para uma simples miúda como eu.
Vi os teus olhos brilharem. Já não é comum ver olhos brilharem assim, espécies em vias de extinção. E não falo da luz a bater de esguelha no olho, quando o sol ou a lâmpada estão a jeito - isso seria ridículo. Talvez brilhar seja palavra demasiado espampanante para um texto desta ordem. Mas vá, vi aquela expressão que mostra que há qualquer coisa em ti de misterioso e inacessível.
Soube-me muito bem a noite. O feminismo activista e a primeira mulher de calções. O fogo-de-artifício que vacilava o peito. A barriga às voltas e o gato ciumento. O quão acolhedoras foram. E a loucura a que nos cedemos pontualmente, que recorda noites que um dia passaram e trouxeram tanto quanto esta.
Será possível que ainda não tenha sono?
“É fácil.”
Papoila